Tramita um projeto absurdo, alias mais um projeto absurdo no Senado, nossos Senadores e Deputados ja mostraram que nada entendem de Internet, e agora muito menos de micro e pequenas empresas. Tal conclusão de que projeto de lei pode causar o fechamento de todas as Lan Houses no páis, foi minha com base em uma analise que recebi de Mário Brandão, presidente da ABCID como segue:
Olá Companheiros,
Hoje me deparo com o seguinte texto em diversos pontos de mídia.
Onde se lê
“De acordo com a proposta, que teve como relator o senador Eduardo Azeredo (PSDB-MG), o cadastro deverá conter o nome completo e o número da carteira de identidade do usuário, além da identificação do terminal por ele utilizado, a data e a hora do início e do término do uso de cada equipamento. O descumprimento dessa obrigatoriedade será punido com multa de R$ 10 mil a R$ 100 mil segundo o projeto, que ainda será examinado, em decisão terminativa, pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ).
Em seu voto favorável, Azeredo observa que a grande maioria dos cyber cafes e lan houses não exige identificação de seus clientes. Essa prática, diz o senador, acaba permitindo que usuários de má-fé utilizem esses estabelecimentos para, a partir do acesso à Internet, “praticar os mais variados crimes”. Em muitos casos, recorda, é possível identificar o endereço do protocolo Internet do terminal utilizado para se cometer um delito.
O relator ressalta ainda que o projeto preserva a privacidade dos usuários de cyber cafes e lan houses, uma vez que os dados guardados nos cadastros só poderão ser fornecidos às autoridades competentes, mediante decisão judicial, nos casos de investigação criminal ou instrução processual penal.”
Pois bem,
Como Lan Houses e Cyber Cafés são minha praia vou tentar externar minha posição com relação ao assunto para que esta possa ser criticada, contraposta ou enriquecida de qualquer outra forma pelos colegas.
Em primeiro lugar gostaria de deixar claro que não sou, nem pessoalmente, nem como representante de uma associação do ramo, nem vejo pares defendendo a NÃO identificação de usuários, o que não me torna favorável a essa lei.
Para existir, o empreendedor que envereda pelo ramo de Lans ou Cybers inicia o processo de construção de seu negocio pela escolha de um software de controle. Ele é imprescindível para a tarifação e controle do acesso. Sem um gerenciador, uma Lan ou Cyber Café não existe.
Há 28 Programas de gerenciamento nacionalizados em português do Brasil, e alguns deles podem ser vistos aqui ou uma análise deles e a relação completa pode ser vista aqui.
Considerando que a soma dos clientes dessas empresas bate com nossa estimativa de 94 mil Centros Públicos de Acesso Pago e que cada um destes espaços usa um único programa, não seria leviano afirmar que pelo menos 96% das lans houses e Cyber Cafés POSSUEM SOFTWARE DE CADASTRAMENTO DE USUARIOS.
Infelizmente também sou obrigado a afirmar que apesar de possuírem os meios, 20% dos proprietários negligenciam o preenchimento de todos os dados nos primeiros 6 meses de vida de seu negócio. E, em média, após perceberem que ao adotar essa postura omissa, esses 20% abrem mão de uma excelente ferramenta de marketing e mailing ou mala direta entre outras possibilidades de ações de consolidação e fidelização, passam a realizar o cadastro completo até para sua própria sobrevivência comercial. E tal como os donos de locadoras de vídeo ou DVD, fazemos cadastros de usuários por necessidade, independente de legislação nesse sentido ou não. E quem não faz, não permanece no mercado, quem faz e o usa como ferramenta, sobrevive. E o MERCADO regula de maneira perfeita o que o estado tenta fazer sem nenhuma eficiência.
O que cai nosso numero teórico para a afirmação: 76% das lans e cybers FAZEM controle e cadastro de usuários.
Pois bem.
Entrando mais um pouco no universo desses espaços, gostaria que os amigos tivessem noção que o valor médio da hora cobrada nesses espaço oscila HOJE, em Outubro de 2008, em um valor que se situa entre R$ 1,00 e R$ 1,50 e em descensão. (ou viés de baixa J)
E a média de equipamentos (estações) por espaço é de 9,58 e também este, um valor médio em queda. dado o movimento de pulverização do mercado com lans cada vez menores.
Mas arredondando para um real e dez maquinas como uma realidade média predominante, podemos derivar que.
Se funcionar 16 horas por dia, o que não é nenhuma incoerência com a realidade da maior parte das casas, temos uma féria BRUTA possível de R$ 160,00 ao dia, que é o resultado do valor da hora (R$ 1,00) vezes o numero de maquinas (10) vezes o tempo que o estabelecimento permanece aberto (16 Horas).
Se tiver o milagroso movimento que signifique 100% das máquinas ocupadas, em 100% do horário de funcionamento todos os 30 dias do mês, ou como chamamos, 100% de taxa de ocupação esse individuo tem um faturamento OTIMO de R$ 4.800,00 (Quatro mil e oitocentos reais) (160×30).
A realidade é que a taxa de ocupação MÉDIA do Setor é de 55% e isso significa um faturamento médio de R$ 2.600,00 (Dois mil e seiscentos reais).
Pois bem, quem em sã consciência acredita que um sujeito desses seja capaz de pagar com esse movimento uma multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) considerando o valor mais baixo estipulado pela legislação proposta?
Fato: 99,98% do ramo não seria capaz de arcar com o pagamento do valor Maximo estipulado na lei.
99,40% do ramo não seria capaz de arcar com o valor MÉDIO estipulado pela lei.
98% do ramo não seria capaz de arcar SEQUER com o valor MINIMO determinado pela legislação.
Portanto, não há, e nem tem como haver, tal como está feita, nenhum caráter EDUCATIVO, nessa legislação, posto que em essência, esta é inaplicável.
Imagine uma multa por excesso de velocidade do valor integral de um veiculo. Ou dez vezes o valor do mesmo.
Ou ainda, pense em uma lei que imponha a uma operadora de telefonia uma multa equivalente a 100% de sua receita BRUTA ANUAL pelo descumprimento do cadastramento de um usuário.
Há uma desproporção entre crime e castigo vergonhosamente estabelecido.
E pior, totalmente desvinculado ao dano que possa ser causado.
Pois tenha havido conseqüência ou não, da omissão no cadastro de um usuário, a simples inobservância do cadastramento implica na aplicação da multa, tenha isso implicado em algum prejuízo social ou não. Ou, tenha havido o cometimento de crime virtual naquele espaço ou não, a multa é aplicável.
Dessa forma, essa multa, que talvez seja um valor irrisório para um nobre senador que tenha vencimentos mensais de R$ 16,2 mil, Auxílio-moradia – R$ 3,8 mil, Verba para contratação de assessores de R$ 48 mil, Verba para pagamento de secretários de R$ 34 mil, Verba para pagamento de despesas pelo exercício do mandato de R$ 15 mil, Verba para pagamento de material gráfico de R$ 733, Verba para pagamento de telefone residencial de R$ 500, Verba para despesas postais de R$ 60 mil, entre outros benefícios. Mas para um sujeito, que em média, é um recém desempregado, que realiza o sonho de ter seu próprio negócio e sobrevive com um valor liquido (lucro) que equivale a 3 ou 4 salários mínimos, o valor é proibitivo mesmo considerando o seu patamar mais baixo.
Mas quisera eu fosse esse nosso único problema.
Como conseqüência pratica de mais esse desastre que é legislar sobre o que se desconhece, o Senador Azeredo nutre de mais uma ferramenta, só que agora a nível federal, todo aquele que acredita que empurrar o ramo para a informalidade resolve o problema dos crimes cibernéticos.
Ignora-se o fato de que o índice de informalidade no ramo ultrapassa 87% e isso se formos condescendentes e considerarmos empresas registradas como cursos de informática, revenda de peças de computador, locação de computadores, escolas de artesanatos, cabeleireiros e até revendas de materiais hospitalares entre outras dezenas de registros errados como empresas formalizadas apenas pelo fato de os mesmos terem ALGUM CNPJ. Seja lá do que for.
Pois acontece que é humanamente impossível registrar-se e estar 100% legal com um Centro Publico de Acesso Pago. Posto que uma série de legislações municipais e estaduais tratam o ramo como um caldeirão fervente de criancinhas. Mas falar sobre isso levaria muito. O fato é que esta visão negativa não é o pensamento reinante dos 28 milhões de pessoas que acessam estes espaços como pode ser visto aqui, e este é um número que possui já uma série histórica em franca ascensão.
Sou da corrente que acredita que, se numa turma, 95% dos alunos tiram uma boa nota e 5% não, o problema, seja qual for, está neles. Pois a maioria conseguiu uma boa avaliação.
Mas se 95% de uma turma apresenta desempenho insatisfatório, o problema pode estar no professor, no sistema de ensino, pode estar em qualquer canto, mas não nos alunos.
Da mesma forma, seria mesmo o ramo, a rigor, imerso em um índice de informalidade estrito de quase 96% responsável por essa situação ou seria essa situação CONSEQUENCIA de uma série de desastres legislativos como esse que caminha para aprovação que ao empurrar o ramo para a informalidade potencializa todo e qualquer ilegalidade que em sua justificativa pretendia evitar.
Pois bem, quem tiver paciência de ler detidamente o projeto de lei, verá que na tal Lei
Parágrafo único. A forma de armazenamento e apresentação dos dados cadastrais exigidos neste artigo será definida em regulamentação.
Onde se abre espaço para o cometimento de aberrações como essa em vigor no Estado do Rio de Janeiro.
Art. 1º – Ficam obrigados todos os estabelecimentos comerciais que locam terminais de computadores para acesso à Internet, a terceiros (público em geral), no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a exigir identidade dos usuários de quando das locações e a manter livro, com data, hora e identificação do usuário, bem como do terminal utilizado.
Ou seja, a opção de adoção de “LIVRO” e tal como exigido pela fiscalização do Rio de Janeiro, LIVRO só é entendido como LIVRO FISCAL, daqueles que não se pode adulterar paginas e nesse sentido vejo até lógica, o que não vejo lógica é adotar um procedimento que torna impraticável a adoção de sistemas eletrônicos de controle, tal como adotados pela maioria esmagadora do ramo, tal qual visto na introdução do texto através de softwares de gerenciamento e que desta forma torna essa legislação, mais um texto natimorto que só se presta á extorsão do proprietário médio que através de toda essa serie de equívocos legislativos é equiparado, pelo simples opção de abrir um negocio que franquia acesso à tecnologia a um criminoso comum.
Seria necessário duzentas infrações por dirigir embriagado para equivaler a não efetuar o registro de um usuário. Isso faz sentido para alguem?
A pergunta que me vem a seguir é, tem o dono de uma lan, discernimento suficiente para identificar, por exemplo, uma identidade falsa?
Tem o Dono de um espaço desses condição de munir-se de meios de proteger-se de uma falsificação de um documento?
A resposta obvia é, não, e pior, nem uma nota falsa o ramo, em média, tem condições de distinguir. Confesso com relativa vergonha que mesmo eu, sendo bacharel, já aceitei sem saber duas notas falsas de 50 reais nos anos em que estive atrás do balcão dos espaços de acesso com que trabalhei.
O que será do sono do proprietário que for confrontado com a possibilidade de receber uma multa 8 vezes o valor inteiro do seu negocio todo, por alguma eventual falha humana no cadastramento de um usuário.
Resumindo, alem de não ser exeqüível, a lei em tramite, incentiva a já preocupante informalidade, e possui como únicos beneficiários, fiscais e assemelhados corruptos que constituem renda extra as custas de achacarem o proprietário médio.
Acho que chama-la de desastre, é pouco.
Poderia dizer mais coisas, mas acho que já me excedi.
mas que não gostaria de estar assistindo a esse filme de terror, não gostaria, mas estou.
Abraços a todos
Mario Brandão
(*) Mario Brandão, proprietário de uma lan house, é administrador de empresas, consultor de TI e presidente da ABCID (Associacao Brasileira de Centros de Inclusao Digital, http://www.abcid.com.br).
Publicado também no Software Livre Brasil